A graça de uma vida mínima
Entenda por que um jovem empresário americano trocou sua mansão de 440 m² por um pequeno apartamento de 40
por Graham Hill
Faz parte da nossa natureza: queremos ter mais coisas o tempo todo. Essa lógica funcionava bem há 200 anos, quando tínhamos acesso a bem poucos produtos. Se pintava a oportunidade de conseguir algo que tornasse nossa vida mais fácil, era bom mesmo aproveitar. Hoje, porém, podemos ter muito mais do que precisamos. As lojas estão abarrotadas de artigos baratos da China e fazem nosso mecanismo biológico acumular até enlouquecer. Isso também é parte de nossa cultura: como a oferta de produtos é ilimitada, os anunciantes nos dizem que precisamos comprar mais para manter a máquina do consumo a todo vapor. Ter uma TV gigante e novinha já não é desejo, mas uma necessidade.Só que cada coisa nova que agregamos às nossas vidas tem custos escondidos. Casas maiores consomem mais energia, mais impostos, mais manutenção. Um carro grande e luxuoso gasta mais combustível e tem a mecânica mais cara. E à medida que compramos as coisas, precisamos de mais espaço para guardá-las. Nos últimos 60 anos, por exemplo, o tamanho médio de um apartamento novo nos EUA aumentou de 91 para 230 metros quadrados. Ocupamos três vezes mais espaço, e continuamos acumulando objetos. De repente, nossas vidas se tornam caras e complicadas. Acabamos trabalhando mais simplesmente para manter o que adquirimos.
Eu levei tempo para perceber isso. Tudo começou em 1998, quando vendi uma empresa de consultoria de internet, a Sitewerks, por uma grana que nunca pensei que ganharia na vida inteira. Comprei uma casa de 440 m² no bairro mais caro de Seattle, apinhada de eletrônicos, roupas, móveis e carros na garagem. Nada mal para um garoto de 20 e poucos anos. Mas a novidade logo virou rotina. Meu Nokia novo já não me satisfazia. As coisas que eu consumia acabaram me consumindo. Eu me sentia mais ansioso do que antes.
Precisei viver um grande amor e viajar bastante para perceber que nada daquilo era essencial. Passei anos rodando o mundo com minha namorada na época. Moramos em várias cidades, conhecendo pessoas interessantes e trabalhando em projetos divertidos. Fizemos tudo isso com um par de malas. Eu tinha grana suficiente para viver numa mansão, mas o que me fazia feliz era viajar por aí, ter grandes experiências e estar apaixonado. Aprendi a dar valor à flexibilidade que eu tinha por possuir poucas coisas. E iniciei o projeto Life Edited (Vida Editada) para buscar soluções nessa área.
Hoje, moro num apartamento de 40 m² em Manhattan com todo o conforto que preciso. Até quarto de hóspedes. Ele foi projetado para uma quantidade reduzida de coisas - as prediletas. Tudo nele é eficiente: minha cama fica embutida na parede e se abre quando vou dormir. Tenho duas TVs: uma na verdade é um telão que fica enrolado numa parede móvel, a outra é também o monitor da minha estação de trabalho. A mesa é mínima e pode ser ampliada para um jantar de até dez pessoas. Não possuo CDs ou DVDs (salvo tudo na nuvem). Tenho só seis camisetas na gaveta e dez tigelas na cozinha. Uma tigela cabe dentro da outra para ocupar pouco espaço, como tudo na casa. Você também pode editar sua vida. Por que guardar aquela calça que não usa há anos? E por que ter um fogão de seis bocas quando raramente usa três?
Não é fácil mudar assim. Tendemos a acreditar que nós somos as coisas que compramos. Que elas indicam nosso grau de sucesso e nos farão felizes. Pagamos caro por um relógio achando que ele vai mostrar aos demais o quanto somos bem-sucedidos. Porém, minutos depois não nos sentimos mais felizes nem mais bem-sucedidos. Essa foi a lição que aprendi nesses 15 anos: uma vez que você tem suas necessidades básicas cobertas - segurança, casa decente, poder sair para jantar, um dia ou mais de descanso por semana, férias -, não há muito mais a fazer para aumentar sua felicidade.
Não estou dizendo que todos devem viver em 40 m². Mas considere os benefícios de uma vida editada. Com menos coisas para guardar e manter, você ganha mais liberdade e um pouco mais de tempo. Só vamos cultivar uma relação equilibrada com o consumo quando começarmos a valorizar as coisas que de fato nos fazem felizes, como os relacionamentos, a família, os amigos e as experiências. Meu espaço é pequeno. Mas minha vida é grande.